É no período compreendido entre os meses de setembro e novembro que a grande maioria dos colégios e institutos educacionais particulares inicia os procedimentos para matrícula de seus educandos para o ano vindouro. Para os pais e responsáveis, trata-se de um momento de suma importância, com anseios de garantir a vaga e a continuidade dos estudos a seus filhos e tutelados; para as escolas, é tempo de organização e captação de recursos para melhor adequação de sua estrutura e de seu planejamento para o próximo ano letivo.
Contudo, especificamente na transição do ensino infantil para o ensino fundamental, não bastam somente um bom rendimento escolar e a aprovação por parte da coordenação pedagógica para que o infante possa, regularmente, matricular-se para o próximo ano.
Deliberações estaduais, como a 73/08 do Conselho Estadual de Educação (SP), por exemplo, estabelecem um critério etário para permitir o ingresso do menor no 1º ano do ensino fundamental: é necessário que a criança complete 6 anos até o dia 30 de junho do ano seguinte. Mais: recentemente, o Supremo Tribunal Federal julgou a Ação Declaratória de Constitucionalidade 17 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 292 que questionavam exigências previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996) e em normas do Conselho Nacional de Educação (CNE), tendo, ao final, em votação apertada, concluído pela constitucionalidade da nova regra de alcance nacional que exige que o educando complete 6 anos até 31 de março do ano letivo para cursar o primeiro ano do ensino fundamental.
A nosso ver, isso não significa, necessariamente, a aplicação da norma incondicional a todos os casos que versarem sobre a matéria discutida. Uma deliberação pode ser constitucional e ter sua incidência afastada em um caso concreto, analisando-se as suas peculiaridades distintivas.
Por ser uma questão extremamente influente na vida de milhões de crianças brasileiras, tal critério – o etário – vem sendo relativizado pelos Tribunais há algum tempo.
Mandados de segurança têm sido impetrados contra decisões das direções e coordenações de colégios educacionais com negativa de matrícula a menores que não tenham preenchido o requisito da idade para a transição do ensino infantil ao ensino fundamental. E os resultados são positivos: é praticamente unânime o entendimento de que a tutela do direito fundamental da criança de matricular-se no primeiro ano do ensino fundamental é garantia constitucional, que não pode encontrar óbice em ato normativo de inferior hierarquia, de tal modo que, comprovados o bom rendimento escolar e a aptidão do menor para progredir de ensino, devem as escolas, obrigatoriamente, autorizar a sua matrícula.
O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, também já decidiu em recurso pretérito que “a capacidade de aprendizagem da criança deve ser analisada de forma individual, não genérica, porque tal condição não se afere única e exclusivamente pela idade cronológica” (REsp 753.565 / MS).
Uma regra de idade, que pode se quebrar por uma sensível diferença de meses, não pode se sobrepor à garantia constitucional de acesso a todos os níveis de ensino (cf. art. 208, V, da CF), valendo lembrar que o art. 54, I do Estatuto da Criança e do Adolescente, também prevê que é dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente o ensino fundamental.
Dito isso, recomenda-se aos pais e aos responsáveis, sempre que houver dificuldade ou barreira imposta pela instituição de ensino para efetivar a matrícula do infante no primeiro ano do ensino fundamental por conta do critério cronológico, que procurem um advogado especialista no assunto, o qual, valendo-se dos instrumentos processuais adequados, poderá, comprovando a capacidade e a aptidão da criança para progredir com seus estudos, obter um provimento jurisdicional que assegure ao menor o que lhe é de direito e que ninguém dele pode tolher: o acesso à educação.
Gabriel Possert Costa Pacheco
Dalila Felix Damian